Morando na zona portuária do Rio de Janeiro, Alice trabalha com leilões e vive intensamente para o trabalho, no qual investiu muito tempo e esforço para alcançar o reconhecimento nos círculos mais prestigiados da zona sul e entre pessoas influentes e ricas. Ambiciosa, bem-sucedida e com um namorado que é o sonho de qualquer mulher, Alice sente que sua vida está perfeita e não mudaria nada.
No entanto, Casseano, seu namorado, deseja dar o próximo passo no relacionamento. Ele quer construir algo sólido, casar com Alice e ter filhos. Mas Alice tem aversão a compromissos sérios. O trauma de ver sua mãe destruída pelo relacionamento com seu pai, a traição e a tristeza que consumiram sua mãe enquanto lutava contra o câncer, deixou marcas profundas em Alice.
“O problema era que, nos recônditos de seu coração, Casseano sabia porque tinha feito aquilo. Ele esperava que Alice ficasse desesperada e aceitasse se casar com ele. Fora uma atitude infantil. Insensata. Arrependia de tê-la magoado. E pior, sentia-se fracassado, pois nem assim fora capaz de convencê-la a morar com ele. Seu mal tinha sido acreditar, de forma arrogante, que não iria perdê-la dessa vez. […] Queria entregar-se completamente àquele sentimento, sem medos, sem reservas, sabendo que haveria um futuro ao lado daquela mulher. Um futuro onde ele faria de tudo para que ela fosse feliz.”
Frustrada com seu relacionamento que está desmoronando e com medo de um compromisso sério, ela se encontra à beira de um colapso emocional. Em meio a um leilão estressante e mal-sucedido, que resultou em um desentendimento com a esposa do contratante, Alice decide visitar sua melhor amiga Luana em Londres, na esperança de encontrar algum alívio para os sentimentos desordenados que atormentam sua alma.
“Talvez a solidão que carrego no peito neste momento se dissipe com a distância ou, pelo contrário, sirva apenas para me mostrar que não foi dos outros que me separei durante os últimos anos… e sim de mim mesma.”
Luana, também brasileira, vive em Londres depois de fugir da Irlanda, após um casamento frustrado com Eamon. Ela se sentia estagnada em sua carreira e, após o nascimento do filho, essa frustração só aumentou. Tudo naquele país começou a incomodá-la, inclusive o comportamento metódico de seu marido, e Luana decidiu fugir de tudo, largando seu marido, filhos e a família que a acolheu, sem olhar para trás para viver o seu grande sonho de se tornar uma atriz famosa.
Eamon, cansado das maluquices e inconstâncias de sua esposa, toma a difícil decisão de ir atrás dela, mudando-se para Londres na esperança de reconquistá-la. Ele acredita que, com bastante esforço e determinação, poderá reacender a chama do amor entre eles. Contudo, Eamon não consegue enxergar os profundos medos e frustrações que consomem Luana.
Em sua tentativa de reconquista, ele segue dando murro em ponta de faca, usando uma abordagem que mistura esforço excessivo e brutalidade emocional. Ele imagina que essas ações farão com que Luana reconheça o amor que ele ainda sente por ela. Mas a falta de compreensão e sensibilidade em relação aos sentimentos dela apenas complica ainda mais a situação, tornando a reconciliação um desafio cada vez maior.
E nessa busca por escolhas, Luana e Alice precisam entender o que realmente desejam e fazer suas escolhas: no amor, na amizade, no trabalho e o que realmente importa para elas.
“Talvez, ponderou, fosse verdade aquele ditado que diz que a distância faz ao amor o que o vento faz ao fogo: apaga o pequeno e inflama o grande.”
Mais do que um simples romance, “O que eu quero pra mim” fala sobre perdão, reconexão consigo mesmo e a busca pelo verdadeiro eu, mesmo quando tudo ao redor parece desmoronar e as coisas não saem como esperado. É um romance que, apesar de poder ser classificado como “clichê romântico” e “água com açúcar”, oferece um conforto semelhante ao que a expressão sugere, acalmando em momentos de grande estresse.
Confesso que achei que o romance repentino entre Eamon e Alice pudesse trazer mais dinamismo e uma pitada de provocação à história (e até fiquei na expectativa de ver isso dando certo), mas o caminho escolhido pela autora foi muito satisfatório. Várias vezes, meus olhos marejaram com as reflexões dos personagens.
“Mas ainda havia um problema ainda maior: no fundo, Alice sabia que o maior motivo para que tivesse decidido ir com Eamon não fora a atração por ele, e sim o ódio que estava sentindo de Casseano. E era ali, bem ali, que morava o perigo.”
A autora aborda profundamente como os traumas infantis podem nos moldar na vida adulta e como as demandas do trabalho podem nos consumir, impedindo-nos de reconhecer nossos verdadeiros desejos. Alice foge de relacionamentos por medo de sofrer como sua mãe, sem perceber que está apenas reagindo a um trauma.
Luana, por sua vez, se afasta de todos que possam reprimi-la ou não a considerarem importante, uma reação às suas experiências de infância, onde, sendo a filha caçula, era excessivamente protegida pelo pai e nunca incluída em nenhuma tarefa, sentindo-se desprezada e insuficiente. Ela saiu de casa para provar que podia ser independente e realizar o que quisesse.
Além de tudo isso, a autora nos faz refletir sobre a importância do autoconhecimento e da compreensão pessoal para nos abrirmos com as pessoas que amamos. Afinal, ninguém pode saber o que se passa na mente e no coração de alguém que sofre em silêncio, sem verbalizar seus sentimentos, medos, aflições e conquistas.
Muitas reflexões me atingiram em pontos sensíveis, pois já vivi algumas das situações pelas quais os personagens passaram. Isso foi muito bom para pensar no quão difícil foi e é sair desse looping de dependência emocional e encontrar algum conforto no trabalho, que acaba te deixando longe de outros pensamentos.
Além disso, as últimas páginas de “O que eu quero pra mim” reforçam a importância de enxergar os nossos traumas e curá-los, e como as escolhas podem definir o nosso futuro como queremos, lidando com medos e imprevistos, mas sempre em busca de sermos melhor do que fomos no passado.
Início da Leitura: 23/06/2024
Término da Leitura: 24/06/2024
Classificação final:
Escrita
Personagens
Enredo
Geral
Lycia Barros
Ano: 2015
Páginas: 208
Idioma: português
Editora: Arqueiro
O que eu quero pra mim é um romance inspirador, que fala sobre a importância de conhecer a si mesmo e descobrir as próprias necessidades antes de trilhar de forma plena o caminho do amor.