Dica de leitura: ouça “A Forest” enquanto lê a resenha completa!
Pois cada penudo que já existiu
Vai se juntar aqui hoje à noite porque
Hoje à noite
Que os Pássaros da Noite vão aprontar.
As férias de verão nunca foram tão divertidas para Alisson, que todos os anos viajava com a família para uma tranquila praia no interior da Inglaterra. O cenário era sempre o mesmo, até que ela conheceu Frankie, uma menina rica que vivia em uma mansão no alto da trilha que dava acesso à praia. Curiosa com o interesse de Frankie pela sua amizade, Alisson aceita o convite para passar os dias à beira da piscina da mansão. O que ela não imaginava era que aquelas férias marcariam para sempre a pior lembrança de sua vida.
Aos poucos, Frankie começa a agir de forma estranha. Até que, em um dia aparentemente comum, convida Alisson para uma festa no meio da floresta. Mas Alisson sabe que aquele local não era um local qualquer, era a floresta que todos os moradores da vila alertavam para evitar, dizendo que, nas sombras daquele lugar, habitavam criaturas que apenas aguardavam o erro de alguém desavisado.
“Meu coração dispara. Uma cantiga infantil começa a tocar sem parar em minha cabeça. Os versos avisando sobre criaturas que se reúnem na floresta. Só que, na versão que eu aprendi, havia algo muito pior à espera. […] Ninguém imagina que uma cantiga infantil possa ser tão sinistra. Mas ali, na floresta escura, era. Era como se viesse de todas as direções, me seguindo entre as árvores.”
Anos depois, Francesca Meadows está prestes a inaugurar o seu novo empreendimento: o Solar. Herdado da avó, o espaço foi transformado por ela em um hotel de luxo, reservado e exclusivo para hóspedes cuidadosamente selecionados. A proposta é oferecer uma experiência de hospedagem espiritual, voltada para o bem-estar e para a conexão com a natureza.
Tudo no Solar exala requinte. A piscina infinita tem uma vista de tirar o fôlego, os lençois são confeccionados com o mais fino linho, as bebidas foram escolhidas por especialistas, e as cabanas — localizadas à beira da floresta centenária que cerca o hotel — foram pensadas como refúgios de imersão completa na natureza.
Francesca já visualiza o sucesso do Solar. Está certa de que a festa de inauguração será o primeiro passo para colocar o local na lista dos melhores hoteis do país. E ela está disposta a fazer o que for preciso para que tudo aconteça exatamente como planejou.
Mas há algo que escapa ao seu controle.
Entre os convidados, uma presença destoa, alguém que não deveria estar ali. Bella, gastou todas as economias que tinha para se hospedar no Solar. Por trás da fachada de mulher realizada, da pose zen, dos discursos espirituais e da imagem de deusa da natureza, Bella sabe que Francesca esconde segredos que ninguém mais conhece, apenas ela. Segredos que a assombraram por anos, até que ela finalmente decidiu que era hora da verdade vir à tona.
“Esse verão marca quinze anos. Um aniversário horrível. Não é exagero dizer que o que aconteceu arruinou minha vida. E, ainda assim, Acho que não chegou a ser nenhuma pedra no sapato dela. Mas estou de volta, como um fantasma passado ponto final não vou deixar que ela esqueça. E sei o que tenho que fazer.“
O passado está ali, impregnado em cada viga da construção. Está nas mesas, nos quartos e entre os sorrisos dos convidados. Mas Bella não vai descansar enquanto todas as mentiras não forem reveladas.
Francesca sempre foi do tipo que consegue tudo o que quer, na hora que quer. Se autointitula mística, esotérica, conectada com as energias do universo, mas o que transparece mesmo é um certo ar de superioridade, como se tudo aquilo fosse apenas um verniz bem polido para atrair o público certo, dar prestígio ao seu empreendimento e fazer o negócio prosperar.
Desde a morte estranha do avô, ela acredita estar finalmente dando nova vida ao lugar onde passou tantos verões da infância. Uma energia renovada, cheia de luz e boas vibrações. O que Francesca não percebe é que o passado nunca foi embora de verdade. Ele observa à distância, à espreita, só esperando o momento certo para sair das sombras.
“Ultimamente tenho voltado a fazer o que fazia quando era criança: fecho as cortinas à noite com o maior cuidado, sem deixar nenhuma festa. Senão parece (sei qual idiota isso soa) que a floresta está me observando.“
O Solar tem esse toque místico, espiritual, quase etéreo… mas tudo embalado num luxo de revista de arquitetura, cercado por uma floresta densa que parece ter vida própria. É bonito, é convidativo, mas esconde mais do que revela.
Bella jamais pensou que voltaria àquele lugar. Antes, era só uma criança curtindo o verão ao lado de sua amiga Frankie naquela mansão. Agora, adulta, carrega nas costas os traumas de algo que nunca foi realmente esclarecido. Aquela noite, o que aconteceu com Jake, o que mudou em Alisson e o que fez Francesca virar essa figura zen, endeusada, que fala em vibrações positivas como quem recita um mantra de defesa.
Confesso que uma das minhas maiores frustrações foi justamente não entender direito o que de fato aconteceu com a Francesca que a fez mudar TANTO. A narrativa insinua, envolve, joga peças, mas não entrega com clareza as motivações reais da transformação de Francesca na figura zen que ela se tornou. Fica essa sensação de cortina de fumaça: ela virou outra pessoa, mas o motivo permanece nebuloso demais, até mesmo para uma trama que aposta no mistério.
Por outro lado, adorei o modo como a autora trouxe uma atmosfera folclórica e sobrenatural ao lugar. O misticismo, os rituais, os pássaros… tinham tudo para ser elementos cheios de simbolismo. Só que no final, senti que tudo isso foi pouco explorado. Faltaram explicações, uma amarração mais sólida entre esses fenômenos e a trama. Ficou parecendo que eram só pinceladas de mistério, sem muita profundidade, quase como um ritual jogado, que perdeu a magia ao ser apenas mencionado.
E isso é uma pena, porque ali havia espaço para algo muito maior, mas faltou conexão com um dos pontos que mais me instigou a continuar lendo, por pensar que haveria, pelo menos, uma abordagem sobre a lenda dos Pássaros.
Agora, uma coisa que eu preciso elogiar: os plots. A forma como os segredos dos personagens vão sendo revelados aos poucos, camada por camada, foi muito bem construída. A cada capítulo, a cada página do diário de Alisson revelado, a gente entende um pouco mais do que foi enterrado ali e o que cada um carrega como cicatriz daquele passado não resolvido.
No fim, O Ritual da Meia-Noite é um livro que prende, mesmo com algumas pontas soltas. Ele acerta no clima, nas reviravoltas, e no suspense que cresce aos poucos. Mas também deixa a sensação de que poderia ter ido mais fundo em seu lado sombrio.
Início da Leitura: 11/04/2025
Término da Leitura: 12/04/2025
Classificação final:
Escrita
Personagens
Enredo
Geral

Lucy Foley
Ano: 2025
Páginas: 336
Idioma: português
Editora: Intrínseca
Francesca Meadows não vê a hora de inaugurar o Solar, seu novo e badalado hotel de luxo no interior da Inglaterra. A vista é um espetáculo. A piscina infinita brilha sob o céu quente de verão. A decoração é chique e sofisticada. Os hóspedes são selecionados a dedo. E a floresta centenária nos arredores do hotel traz um clima rústico à experiência.